Questão discursiva sobre John Locke, da UEL 2020

(UEL/2020) Leia o texto a seguir.
Tendo o homem nascido com um direito à liberdade perfeita e em pleno gozo de todos os direitos e privilégios da lei da natureza, da mesma forma que qualquer outro homem ou grupo de homens no mundo; tem ele por natureza o poder não apenas de preservar sua propriedade – ou seja, sua vida, sua liberdade, seus bens – contra as depredações e intentos de outros homens, como também de julgar e punir as violações dessa lei por outros. […] Sempre que qualquer número de homens se reúne em uma sociedade de modo que cada um renuncie ao poder executivo da lei da natureza e o confie ao público, então, e somente então, haverá uma sociedade política ou civil.
Adaptado de LOCKE, J. Segundo Tratado sobre o Governo: ensaio referente à verdadeira origem, extensão e objetivo do governo civil.
§§ 87- 88. In: LOCKE, John. Dois Tratados sobre o Governo. Tradução de Júlio Fischer. São Paulo: Martins Fontes, 1998.

Com base na leitura do texto, discorra sobre como Locke fundamenta a formação da sociedade política.

RESOLUÇÃO (banca elaboradora de provas da UEL):
Para John Locke, no Segundo Tratado sobre o Governo Civil, a legitimidade do poder político – base do governo civil – encontra-se radicada no consentimento unânime dos governados. Com efeito, segundo ele, “não é qualquer pacto que põe fim ao estado de natureza entre os homens, mas apenas o acordo mútuo pelo qual todos se obrigam juntos a constituir uma comunidade e formar um corpo político”. Assim, a justificação do exercício do poder civil não se encontra
na tradição e, tampouco, na força. O contrato lockeano, diferentemente do contrato hobbesiano, é firmado por homens que, iguais, absolutamente livres e dotados de razão, concordam mutuamente em formar a sociedade civil, confiando-lhe o propósito de preservar aquilo que lhes pertence, em sua condição natural, ou seja, proteger e consolidar seus direitos naturais inalienáveis e irrenunciáveis: sua vida, sua liberdade, seus bens. Intentam, por meio do pacto, evitar e remediar as inevitáveis inconveniências do estado de natureza quando, pela ausência de juízes e de leis positivas, cada indivíduo exerce seu poder de julgar e punir por qualquer dano que lhe foi causado. Para John Locke, só existe uma sociedade política onde cada um dos membros renunciou a esse poder natural e o depositou nas mãos da comunidade política. Há de se ressaltar que, diferentemente de Hobbes e outros contratualistas, John Locke não concebe um pacto de sujeição, no qual os pactuantes se submetem a um poder comum. Ele concebe apenas o pacto de associação pelo qual os homens consentem em formar uma sociedade política. Nela, o povo, como verdadeiro detentor do poder
soberano, outorga aos poderes constituídos no governo civil a sua confiança, sem se submeter a eles. Por essa razão, a rebelião apresenta-se como uma possibilidade caso a autoridade civil não cumpra seus objetivos. Enfim, a
justificação do poder político legítimo conjuga duas interfaces indissociáveis do contrato lockeano: sua constituição a partir do consentimento mútuo firmado por homens livres e iguais, que se unem voluntariamente, e sua finalidade, a de garantir a segurança da propriedade dos indivíduos (vida, liberdade e bens). Realiza-se, assim, a instituição de um verdadeiro corpo político regido pela vontade de seus membros livres para alcançar a paz comum.

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